Pé de Livro - Maiá Gozzano

domingo, 15 de agosto de 2010

Embriagados de poesia

Lendo poesia
Ainda era escuro quando chegamos. Alguns carros passavam, um homem montava sozinho o palco para o show de logo mais. Munidos de tesoura, cola e um arremessador de fitas especial, começamos o trabalho.
O primeiro livro foi muito especial e mereceu fotos e aplausos.
Estávamos extremamente felizes e excitados.
Levamos uma garrafa de café e torta de banana. Tinha até uma toalha vermelha xadrez, mas achamos que seria um pouco forte fazer um verdadeiro piquenique durante a plantação.
Mas sem dúvida o que vai ficar na memória de todos foi o aparecimento do "Quizz Man", o que seja lá que venha a ser isso.
Era um andrilho, cheio de sacolas de  material reciclagem que perguntou se não tinha problema ficar por ali.
Não  tinha. Ficou. Perguntou se era filmagem. Foi ficando e contando que já foi convidado para programas de tv.
Foi embora com a pérola: "É mais tarde o show, né? Volto depois, se precisar de mim é só falar, eu sou um quizz man, tô sem equipe aqui, mas eu me garanto. Sozinho mesmo dou o meu recado, tamos aí!"
Tamos aí, nós também.
A gente não sabe que horas começou o "show". Depois de colocar todos os livros, lemos poesia, meio tímidos. Não era timidez de falar em público, era timidez de dizer para o plantador do lado que estava feliz e que valia a pena, e que bom estarmos ali, pulado da cama cedo ou nem mesmo ter dormido só para viver aquele momento.
Tomamos café e comemos a torta.
Foi difícil sair de perto da nossa árvore sequinha, talvez a mais linda-feia do parque. E fomos. Adiamos a distância, com um café logo ali. Alguém sugeriu ir a pé, só pra ter como voltar e ainda vê-la mais uma vez.
Fomos, tomamos café, vimos as manchetes dos jornais e voltamos.
Ela ainda estava lá. Intacta.
Um marcador de livro caiu. Alguém foi lá e recolocou.
Fomos embora.
Mas já no final do caminho, eu e T voltamos. Ai que dó de não ver. Ai que curiosidade de ver.
E ficamos. De longe. escondidos, Olhando.
Olhamos as pessoas passarem ao largo como se uma árvore seca embelezada de livros fosse invisível.
E elas passavam correndo, caminhando e nada.
A nossa árvore na paisagem urbana,  nosso presente para a cidade que amanheceu mais velha ficou lá.
Até que a mulher chegou... nosso coração a mil. Será que ela pega, será que ela gostou, será que ela  viu?
Ela viu, ficou meia hora rodando em volta da árvore, lendo livro por livro (e foram quase 50) recolheu do chão 4 marcadores que caíram, e enlaçou novamente os marcadores em seus livros.
Rodou, rodou e rodou, feito criança em loja de doce.
E continuou sua caminhada. Sem recolher um livro, sem escolher mesmo aquele em que ficou um tempão  lendo.
Não sabemos se voltou depois ou se mais pessoas já passaram por lá.
Sabemos que a plantação foi boa. E esperamos que a colheita também seja.
Até vamos voltar para o show.
E vamos fazer cara de paisagem e achar a coisa mais normal do mundo, uma árvore amanhecer assim, tão linda.


Feliz Aniversário, terra rasgada.

Plantador E.

2 comentários:

  1. Se pudesse, em nome da cidade, agradecer esse presente!
    Quanta prentensão!
    Mas como sou parte, posso!
    Que lindo presente: Obrigado pelo carinho e pela sensibilidade!

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  2. Sabe aquele sentimento de criança quando inventa uma brincadeira? Foi essa a sensação prazerosa que sentimos!
    Valeu a pena ficarmos acordados!
    A e D (se assim podemos nos classificar também!)

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